O que é suposto ser um Executive Counselor?
Parece que a “moda”, que levou muitos consultores a dirigirem a sua oferta maioritariamente ao apoio de tipo psicológico, está a perder ímpeto. Os Executivos de nível C tiveram tempo suficiente para avaliar as diferentes abordagens e não é um segredo que os níveis de satisfação com esses serviços fortemente “intra-pessoais” teoricamente baseados na psicologia, não são tão grandes como alguns poderiam esperar.
Em breve, todos esses serviços devem aproximar-se muito mais da melhoria da performance inter-pessoal, em aspetos mais práticos, uma vez que os recursos devem ser cada vez mais orientados para os resultados operacionais.
Devo dizer que não tenho nada contra as abordagens psicológicas, pelo contrário, como pode ser verificado por quem quiser consultar o meu currículum e publicações. É exatamente por isso que tenho muito cuidado ao aplicar o conhecimento adquirido através do estudo dessa disciplina.
A principal debilidade de certas abordagens reside num erro de conceito entre a necessidade de fortalecer as habilidades individuais e a necessidade de melhorar a interatividade de perspectivas e ações, por meio da comunicação interpessoal. É verdade que esses aspectos estão inter-relacionados, mas a questão é: por onde começar? Também podemos aceitar colocar em equação a bem conhecida máxima: “quem quer mudar o mundo, deve começar por mudar-se a si mesmo”. Mesmo assim, uma questão importante permanece: onde está a prioridade? O executivo deve atuar como um grande maestro de orquestra ou tornar-se um excelente instrumentista?
De acordo com minha experiência de décadas trabalhando como, e com executivos de nível C, acho que aprendi algo sobre o que é suposto ser um Executive Counselor. O que eu exponho não se baseia apenas na minha interpretação da “realidade”, mas também no que tem sido requerido pelos clientes que nos têm contratado (aos meus colegas e a mim próprio), ao longo de mais de uma década. Mesmo assim, sendo um defensor do conhecimento operacional, em detrimento de teorias preconcebidas e deterministas, devo assumir que não é possível propor uma perspectiva que seja compartilhada por todos.
No entanto, podem-se propor algumas “guidelines”, que embora estejam longe de conceitos tradicionais, podem ser úteis para esclarecer certos aspectos.
O mais importante é evitar a confusão sobre a abordagem multidisciplinar e multidimensional do Executive Counseling. Admitindo que o termo “counselor” é frequentemente relacionado com a orientação psicológica individual, quando se trata do âmbito de executivos “C-level”, o foco deve mudar completamente.
Um dos principais fatores de sucesso, na resolução de problemas organizacionais, é entender as regras informais de interação que, frequentemente, constituem por si mesmas uma espécie de “governo sombra” dentro do sistema.
O Executive Counselor deve ter o conhecimento, a experiência e a metodologia apropriados para ajudar o executivo a investigar estes aspectos, de maneira sutil, através da introdução de mudanças muito pequenas que não causam resistência no sistema de interações. Usando o conhecimento operacional obtido desta maneira, mais que o conhecimento derivado de experiências anteriores, será muito mais fácil identificadar o ponto de alavanca certo para intervir, caso seja necessário. É a forma mais eficaz e eficiente de o conseguir, baseada no método de “action-research” assim definido por Kurt Lewin (“fundador” da psicologia social).
Análise do sistema de negócios mais do que análise psicológica:
Com as palavras de Paul Watzlawich em “Insight may cause blindness”: “Uma maneira de evitar a complexidade é a abordagem clássica, que consiste em dividir o todo em partes, estudar cada uma separadamente e assim, esperar conseguir compreender tudo.”
De uma forma irónica e paradoxal, mas muito incisiva, este ex-professor da Stanford University, membro do conhecido Palo Alto Group que foi o pioneiro na introdução da “Interactional View” em psicologia, destaca a importância fundamental de enfrentar a complexidade em vez de a evitar.
Em vez de entender e propor a preparação psicológica como a sua principal mais-valia profissional, o Executive Counselor deve entender como o sistema da organização funciona, a sua linguagem e cultura específicas, assim como os aspectos fundamentais do negócio, tendo em consideração todos os “stakeholders”. Assim, o principal compromisso do Executive Counselor deve ser facilitar as decisões que exijam uma análise mais cuidada, propondo formas de ampliar os pontos de vista e diminuir a complexidade das interações.
Para este fim, O E.C. também deve ter um bom nível de conhecimento e experiência integrada em aspectos fundamentais de gestão, tais como Estratégia Empresarial, Marketing, Aspectos Jurídicos, Questões Financeiras, Recursos Humanos, Formação, Comunicação de Crise, Resolução de Conflitos e habilidades gerais de Problem-Solving. Isto significa que deve ser um profissional com experiência de nível executivo, especialmente preparado e que proporcione um nível alto de competências para lidar com as interações complexas dos contextos empresariais.
Os acordos e os desacordos não se baseiam apenas nas interpretações divergentes das regras do sistema de interação (formais e informais). As divergências também podem estar baseadas em diferentes interpretações do conteúdo (interação das disciplinas de management). Isso significa que se pode estabelecer uma mais complexa “interação de interações” que o E.C. poderia não entender, se não tivesse um conhecimento suficiente de tais disciplinas.
O Executive Counselor não é um coach ou um mentor:
A prioridade do Executive Counselor não se deve concentrar no desenvolvimento de talentos nem deve atuar como suporte para alcançar objetivos pessoais ou profissionais, através de formação ou orientação. Os executivos de nível C não costumam procurar esse tipo de ajuda, mas sim um profissional que entenda os vários aspectos de uma questão complexa, que possa ser um interlocutor válido para trocar e confrontar ideias, abrindo assim um maior número de pontos de vista e facilitando a tomada de decisão.
Por outro lado, o papel de um mentor também não é adequado, uma vez que a pessoa que tem mais experiência e conhecimento de seu próprio negócio é, obviamente, o cliente.
Metodologia clara:
O Executive Counselor deve seguir uma metodologia de trabalho tão rigorosa quanto flexível, que seja completamente “transparente” para o cliente. A estreita colaboração entre o executivo e o counselor, aplicando essa metodologia baseada em técnicas de comunicação e de resolução de problemas, deve ajudar a esclarecer e definir objetivos, bem como a melhor forma de avançar com a estratégia adequada.
No nosso caso, temos uma metodologia que se enfoca na análise do funcionamento do sistema específico de interações, das decisões tomadas, das ações implementadas e dos resultados obtidos. Um modelo verdadeiramente orientado para a “action-research”, baseado nos fundamentos da Escola de Palo Alto e da psicologia social moderna. Em qualquer caso, o mais importante é ter uma metodologia de trabalho estruturada com a qual o executivo concorde, dando-lhe um alto nível de confiança para trabalhar em conjunto com o counselor.
De um enfoque pessoal ao inter-pessoal:
Como já foi dito anteriormente, um dos principais erros é centrar a atenção nos aspectos psicológicos individuais (geralmente, os executivos de nível C já têm um bom “background” nesse campo). Evidentemente, isso não significa que os aspectos psicológicos não sejam importantes, mas não devem ser concentrados no profissional que pede ajuda, a menos que isso seja expressamente solicitado.
Segundo uma perspectiva sistémica e estratégica, é muito mais eficaz e mais eficiente encontrar soluções para questões pessoais por meio de intervenções adequadas nos sistemas de interação, do que tentar fazê-lo ao contrário.
Da formação clássica às reuniões operativas:
“Geralmente, uma pessoa relaciona-se com outra sob a suposição tácita de que a outra compartilha a sua visão da realidade, que existe apenas uma realidade”.
Recorri mais uma vez a uma frase escrita por Paul Watzlawick, para ilustrar como as perspectivas convergentes são importantes, quando se trabalha numa definição e implementação de estratégias. Todos sabemos que é a única forma de que as estratégias conduzam a metas alinhadas. É fácil dizer, mas é difícil pôr em prática!
Também sabemos que, numa reunião clássica ou numa formação clássica, as pessoas não estarão 100% do tempo na nossa “sintonia”. Não importa o esforço que apliquemos para construir uma equipa coesa em reuniões tradicionais; as deficiências pontuais na comunicação estarão sempre presentes. Uma das missões do E.C deve ser ajudar a aumentar as condições para transformar os espaços de reuniões tradicionais em reuniões operacionais.
Usando uma imagem metafórica de uma reunião operativa, o E.C. deve agir como um marinheiro experiente que incorpora uma tripulação inexperiente no seu “barco” (metodologia). Ele ensina e ajuda a manobrar o seu próprio barco para chegar ao destino (objetivo) que os participantes decidiram anteriormente. Isso deve ser feito seguindo o rumo e as manobras de navegação que foram definidas em conjunto por todos os participantes. O “barco”, a metodologia que originalmente “pertencia” ao Conselheiro Executivo, torna-se parte integrante e operacional do trabalho dos participantes. Consequentemente, eles vão assumindo progressivamente a posse da “embarcação” que assim será transferida, de maneira natural, para a sua realidade operativa.
Embora se trate de uma metáfora, deve ser evitada qualquer conotação com um jogo. O adjetivo “operativo” significa lidar com problemas reais que têm impacto no ambiente de trabalho e nos resultados empresariais.
Finalmente, quando os círculos virtuosos das interações substituem os viciosos, para o está a chegar o momento do Executive Counselor partir. Desta forma, todos terão a oportunidade de aumentar a sua própria autonomia e navegar no seu próprio navio, evitando o efeito indesejável da dependência de “especialistas”.